sexta-feira, 23 de maio de 2008

Querida Marina *

Escrito por Frei Betto
16-Mai-2008

Caíste de pé! Traze no sangue a efervescente biodiversidade da floresta amazônica. Teu coração desenha-se no formato do Acre e em teus ouvidos ressoa o grito de alerta de Chico Mendes. Corre em tuas veias o curso caudoloso dos rios ora ameaçados por aqueles que ignoram o teu valor e o significado de sustentabilidade.

Na Esplanada dos Ministérios, como ministra do Meio Ambiente, tu eras a Amazônia cabocla, indígena, mulher. Muitas vezes, ao ouvir tua voz clamar no deserto, me perguntei até quando agüentarias. Não te merece um governo que se cerca de latifundiários e cúmplices do massacre de ianomâmis. Não te merecem aqueles que miram impassíveis os densos rolos de fumaça volatilizando a nossa floresta para abrir espaço ao gado, à soja, à cana, ao corte irresponsável de madeiras nobres.

Por que foste excluída do Plano Amazônia Sustentável? A quem beneficiará este plano, aos ribeirinhos, aos povos indígenas, aos caiçaras, aos seringueiros ou às mineradoras, hidrelétricas, madeireiras e empresas do agronegócio? Quantas derrotas amargaste no governo? Lutaste ingloriamente para impedir a importação de pneus usados e transformar o nosso país em lixeira das nações metropolitanas; para evitar a aprovação dos transgênicos; para que se cumprisse a promessa histórica de reforma agrária.

Não te muniram de recursos necessários à execução do Plano de Ação para a Prevenção e Controle do Desmatamento da Amazônia Legal, aprovado pelo governo em 2004. Entre 1990 e 2006, a área de cultivo de soja na Amazônia se expandiu ao ritmo médio de 18% ao ano. O rebanho se multiplicou 11% ao ano. Os satélites do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) detectaram, entre agosto e dezembro de 2007, a derrubada de 3.235 km2 de floresta.

É importante salientar que os satélites não contabilizam queimadas, apenas o corte raso de árvores. Portanto, nem dá para pôr a culpa na prolongada estiagem do segundo semestre de 2007. Como os satélites só captam cerca de 40% da área devastada, o próprio governo estima que 7.000 km2 tenham sido desmatados. Mato Grosso é responsável por 53,7% do estrago; o Pará, por 17,8%; e Rondônia, por 16%. Do total de emissões de carbono do Brasil, 70% resultam de queimadas na Amazônia.

Quem será punido? Tudo indica que ninguém. A bancada ruralista no Congresso conta com cerca de 200 parlamentares, um terço dos membros da Câmara dos Deputados e do Senado. E, em ano de eleições municipais, não há nenhum indício de que os governos federal e estaduais pretendam infligir qualquer punição aos donos das motosserras com poder de abater árvores e eleger ($) candidatos.

Tu eras, Marina, um estorvo àqueles que comemoram, jubilosos, a tua demissão – os agressores ao meio ambiente, os mesmos que repudiam a proposta de se proibir no Brasil o fabrico de placas de amianto e consideram que "índio atrapalha o progresso". Defendeste com ousadia nossas florestas, biomas e ecossistemas, incomodando a quem não raciocina senão em cifrões e lucros, de costas aos direitos das futuras gerações.

Teus passos, Marina, foram sempre guiados pela ponderação e fé. Em teu coração jamais encontrou abrigo a sede de poder, o apego a cargos, a bajulação aos poderosos, e tua bolsa não conhece o dinheiro escuso da corrupção.

Retorna à tua cadeira no Senado. Lembra-te ali de teu colega Cícero, de quem estás separada por séculos, porém unida pela coerência ética, a justa indignação e o amor ao bem comum. Cícero se esforçou para que Catilina admitisse seus graves erros: "É tempo, acredita-me, de mudares essas disposições; desiste das chacinas e dos incêndios. Estás apanhado por todos os lados. Todos os teus planos são para nós mais claros que a luz do dia.

Em que país do mundo estamos nós, afinal? Que governo é o nosso?".

Faz ressoar ali tudo que calaste como ministra. Não temas, Marina. As gerações futuras haverão
de te agradecer e reconhecer o teu inestimável mérito.


* ministra do Meio Ambiente

Frei Betto é escritor e assessor de movimentos sociais, autor de "A Obra do Artista – uma visão holística do Universo" (Ática), entre outros livros.


fonte: Correio da Cidadania

Não defendemos a natureza

Ontem o preço do petróleo bateu seu recorde. E veremos isso todos os dias daqui para frente, nem é preciso explanar aqui sobre o conceito básico de “oferta/procura”, nem sobre os fatores que levaram a escassez do ouro negro e ainda sobre sua imensa necessidade à propulsão econômica mundial.
Lá no Ártico a preocupação é nenhuma. Os ursos polares nem ao menos viverão para presenciar o tamanho da tragédia. Você parou pra pensar que a probabilidade de a Torre Eiffel continuar em Paris nos próximos quarentas anos é maior do que as perspectiva de vida dos Ursos Polares? Não está na hora de você rever o seu passeio turístico?
A aposta agora é a seguinte: quem virá primeiro a derrota da Amazônia ou do Petróleo? Nem vamos aqui colocar os Ursos Polares na aposta, estes, já estão no limbo.

Essa parcialidade verde, “a natureza como sagrado, a natureza como bem estar, a natureza como provedora” é altamente nociva e danosa.

Não somos julgadores da natureza, nem seus amigos, seus comparsas. Somos parte dela. Os animais não abraçam árvores, os rios não dançam em volta de fogueiras para a Grande Criação. Eles celebram a vida preservando-a. É o instinto de sobrevivência básico de qualquer ser: menos do sábio Homo-sapiens, que perdeu este conceito há muito já.

Ingênua, eu?
Não estou ignorando as tecnologias, os avanços, os meios de trabalho e produção. Sabemos todos que viver como nômades-preservadores-do-meio é algo insustentável e irreal. Então porque não propor um novo caminho?

Caímos então na armadilha: não estamos em uma auto-estrada que só leva a um trajeto; mote do discurso enfadonho dos ambientalistas; proteja a natureza diga “não” ao modo de vida que você leva, ande de bicicleta (cara, eles conhecem São Paulo?), faça yoga (!), filie-se a uma ONG.

Então, eis o novo caminho!
Vamos lá! Não sejam vocês, queridos “defensores da natureza”, ingênuos. Natura Ecos, Whole Foods, papel reciclado da Suzano, carros menos poluentes, e milhares de exemplos estão aí para atender a vocês com o slogan: empresa que preserva o meio ambiente. Lindo, palmas!! Você não come produtos trangênicos segundo a listinha do Greenpeace, você recicla o seu lixo em casa e faz palestras nas escolas locais.

E aí está a questão: a própria economia já captou (e porque não, cooptou) essa parcela consciente da população mundial. Até o açúcar mascavo cresceu na indústria. Porque eles querem defender a natureza? Não, o fato é o lucro em defender a natureza e por isso, e só por isso, que o mundo não vai explodir em Tsunamis, chuvas ácidas, gases venenosos, furacões, etc, nos próximos quarenta anos, juntos com os ursos polares.

Você, que come comida orgânica, faz isso porque que defender a natureza? Então você está tão errado quanto o presidente da Monsanto. Ou você acha que ele compra comida no mercadão? Não, dear, e na área de orgânicos do Empório. Ingenuidade sua achar que pode defender a natureza. Defenda-se das suas próprias perspectivas, é o que eu aconselho.

A postura deve ser ativa, inclusiva, interna.
Não adianta você ver a natureza como sagrado, se não é assim que você se enxerga afinal, o que os separam?
Vamos deixar a balela ecochata para as grandes ONG´s que podem contribuir em uma escala maior, invadindo navios que transportam madeira ilegal, queimando laboratórios de pesquisa.

Quando você colocar a próxima “mini carrot” na sua boca, enquanto tecla no seu mac book air, saiba: a natureza sabe responder sozinhas as agressões que estamos enfrentando, e seu sistema imunológico fará algo simples: expurgará esta doença que a afeta; nós.

Você já está neste organismo vivo que é o nosso planeta, basta saber se a sua escolha é ser o câncer ou um glóbulo branco.